AGROSOFT 99
II Congresso da SBI-Agro


Um Sistema de Apoio à Decisão Para Avaliação ex-ante da Recria de Fêmeas de Rebanhos Leiteiros em Confinamento

 

Autores 

Moisés de Andrade Resende Filho
Email: marf@fea.ufjf.br
Vínculo: FEA/UFJF
Endereço: Campus Universitário. Martelos. 36036-330. Juiz de Fora - MG
Telefone:

Marcelo Rezende Pinto
Email:
Vínculo: FEA/UFJF - Bolsista do programa PIBIC/CNPq/UFJF

Oriel Fajardo de Campos
Email: Oriel@cnpgl.embrapa.br
Vínculo: CNPGL/EMBRAPA

Rosane S. Lizieire
Email:
Vínculo: PESAGRO-RIO

Resumo

O pecuarista leiteiro deve decidir entre recriar os animais de reposição, adquiri-los ou terceirizar sua criação. Optando por recriar, deve ainda, encontrar a melhor alternativa econômica de produção. Apresenta-se um sistema de apoio à decisão que, com base em equações de exigência nutricionais e consumo de ração do NRC (1989) atreladas a um modelo de programação linear, possibilita quantificar de forma ex-ante os custos com alimentação de fêmeas recriadas em confinamento até o peso recomendado à cobrição, além de gerar o plano de alimentação a ser implementado pelo pecuarista de modo a minimizar o custo com a alimentação dos animais em recria. Exemplos de utilização do SAD são apresentados e avaliados.

Abstract

The dairy cattle growers, usually, need to choose among breeding their own dairy heifers, purchasing them or contracting someone to growth them. If he/she choose to breed his/her own dairy heifers, he will need to find out the best production strategy in economic terms. A Decision Support System which uses a linear programming model using nutrient requirements and daily dry matter intake equations, both in agreement with NRC (1989), is presented. The DSS is able to account the ex ante dairy heifers feeding cost up to breeding weight and helps the user to find out the minimum feeding cost plan to be put in use. Some DSS uses are presented and evaluated.

Palavras Chaves

SAD; Programação Linear; Custo com alimentação; Fêmeas de rebanhos leiteiros.

 

1. INTRODUÇÃO

A cadeia agroindustrial do leite no Brasil vem passando por profundas transformações, decorrentes da liberação do preço do leite, no final de 1991; dos efeitos do plano Real, a partir de julho de 1994; e da abertura comercial iniciada no princípio dos anos 90, principalmente com a consolidação do MERCOSUL (Mercado do Cone Sul). Tais transformações vem promovendo modificações visíveis no consumo, produção e industrialização do leite no Brasil.

Apesar do aumento da produção e produtividade do leite no Brasil (Gomes, 1997), o atual estágio deste setor encontra-se abaixo do seu potencial. Deresz (1992) sugere como uma das causas da baixa produtividade de leite no Brasil, a avançada idade ao primeiro parto das novilhas resultado da má alimentação e manejo desta categoria animal em sua recria. Tal fato, ocasiona a diminuição da taxa de natalidade do rebanho, reduzindo a taxa de descarte de vacas velhas e, ou de baixo potencial de produção de leite, atrasando o melhoramento genético do rebanho, com conseqüente redução na renda da atividade leiteira.

Nesse ponto, Yamaguchi et al. (1997) ressaltam que o produtor de leite se depara com as seguintes questões: recriar os animais de reposição ou adquiri-los no mercado, ou ainda, terceirizar sua criação? Dessa forma, seria importante quantificar previamente os custos necessários à produção da fêmea pronta para a primeira cobrição gerando, assim, indicadores que permitissem comparações entre potenciais alternativas de condução e com os preços de aquisição das novilhas prontas para reprodução.

 

2. MODELO CONCEITUAL

Pressuposições tomadas para a formulação do modelo matemático inserido no SAD para recria de fêmeas leiteiras.

Considerando-se as recomendações técnicas e que as equações para exigência nutricionais e consumo são funções do peso vivo dos animais, subdividiu-se o período da recria em duas três subfase como se segue: A pré-puberdade foi subdividida em duas subfases com base no peso vivo do animal: A primeira subfase é delimitada pelo peso inicial da fêmea (informado pelo usuário do SAD). Subtrai-se o peso à puberdade (Tabela 1) do peso inicial da bezerra encontrando-se, dessa feita, o total em quilogramas que cada animal deverá ganhar durante toda a pré-puberdade, divide-se tal valor por dois e soma-se a ele o peso inicial das fêmeas, gera-se assim, o peso final da primeira subfase da recria; Na segunda subfase, a fêmea terá o peso inicial correspondente ao peso final da primeira subfase da recria e o seu peso final corresponderá ao peso à puberdade da fêmea segundo Tabela 1. A fase de pós-puberdade que corresponde à terceira subfase, foi definida tendo como peso inicial, o peso à puberdade de cada raça e peso final determinado pelo peso recomendado à cobrição (Tabela 1).

 

Raças Tipo Peso Vivo (kg)
Puberdade Cobrição
Holandesa

Guernsey

Jersey

Mestiças Holandês-Zebu

Grande

Pequena

Pequena

Grande

275

225

205

305

340

250

230

330

Tabela 1: Peso vivo à puberdade e à cobrição para algumas raças leiteiras segundo Campos e Lizieire (1995).

 

3. MODELO MATEMÁTICO

O problema de programação linear (PPL) para minimização do custo de cada ração a ser formulada e fornecida as fêmeas de rebanhos leiteiros em recria em cada subfase t, é definido como:

Minimize CRt =  (1)

onde:

t varia de 1 a 3 incicando cada uma das subfases da recria;

CRt = Custo da ração a ser fornecida aos animais em confinamento em R$ para cada 100 kg de matéria seca, para a subfase t. É a função objetivo do PPL;

Pri = preço de mercado ou custo de produção em R$/kg de cada alimento i (em matéria natural) disponível à formulação da ração, o SAD é capaz de considerar um vetor de 50 alimentos;

Xit = Variáveis de decisão do modelo. Corresponde a quantidade de cada alimento i em kg de matéria seca na ração para a subfase t;

MSi = porcentagem de matéria seca de cada alimento i. Tem seus valores tabelados com base em análise químico-bromatológica dos alimentos;

O modelo de programação linear possui 17 restrições constituídas das necessidades mínimas de NDT (Nutrientes Digestéveis Total), Proteína Bruta, Cálcio e Fósforo todos geradas via equações do NRC (1989), como apresentado em Resende Filho et. al. (1999), além de restrições quanto a participação de alguns alimentos na ração a ser formulada.

Uma vez realizado a minimização dos custos das rações para cada uma das subfases t da recria, o SAD poderá gerar o custo total previsto com alimentação (CTA), utilizando para tanto a seguinte formulação matemática:

CTA =  (2)

CAt = ()/100 * CVMSt * NDt * NA (3)

Onde:

CAt = Custo com alimentação em R$ para cada subfase t;

CVMSt = consumo voluntário de matéria seca, segundo NRC (1989);

NDt = número de dias em cada subfase t. Calculado dividindo-se o peso a ser ganho por cada animal em cada subfase t pelo ganho de peso diário estabelecido pelo usuário do SAD;

NA = Número de animais em recria, informado pelo usuário do SAD.

 

4. EXEMPLOS DE UTILIZAÇÃO DO SAD

Foram executados sete exercícios distintos, simulando situações factíveis para a região Sudeste do Brasil, considerando-se o balanceamento de rações de custo mínimo com os alimentos e suas respectivas composições segundo Tabela 2. 

Alimentos MS(%) PB(%) NDT(%) Ca(%) P(%) Custo (R$/t)
Silagem de milho 33 8 68 0,28 0,22 26,00
Milho, grão moído 89 9 85 0,03 0,26 190,00
Soja, farelo 90 50 84 0,29 0,68 300,00
Fosfato bicálcico 100 0 0 23 18 90,00
Cloreto de Sódio 100 0 0 0 0 130,00
Calcário calcítico 100 0 0 38 0 450,00

Tabela 2: Composição, na base da matéria seca, e custo dos alimentos utilizados no exercício de simulação, segundo Campos et al. (1995) e SIAGRO (1999).

Foram consideradas bezerras holandesas com peso inicial de 80 kg (aos 90 dias de idade), admitindo-se peso à puberdade de 275 kg e peso dos animais aptos para a reprodução de 340 kg (Tabela 1). Observa-se que as durações da recria, obtidas no exercício, são coerentes com os sistemas de produção de leite em fazendas da região Sudeste que utilizam este tipo de animal. No caso da estratégia de ganho de peso contínuo de 650 gramas por dia nas três subfases, desempenho considerado como uma referência teórica para a raça, o SAD prevê que a novilha estaria apta à reprodução aos 440 dias de idade (90 dias de idade da bezerra + 400 dias de recria), ou 16,3 meses de idade (Tabela 3).

O custo com a alimentação em cada subfase t e o custo com a alimentação total de uma fêmea em recria foram calculados pelo SAD, segundo equações (2) e (3). O custo com alimentação, calculado tomando-se a referência teórica para a raça holandesa em recria foi de R$192,37, condizente, portanto, com informações obtidas junto a criadores e com os dados referentes a custos de produção de fêmeas da raça holandesa em recria em confinamento, publicados por Yamaguchi et al. (1997). As demais alternativas de taxas de ganho testadas também apresentaram resultados condizentes com o trabalho supra citado (vide Tabela 3). 

Ganhos de peso nas subfases (g/animal/dia) Duração das subfases (dias) Custo por subfase e total (R$)
1 2 3 1 2 3 Total 1 2 3 Total
800 800 800 122 122 81 325 44,95 71,43 55,28 171,66
700 700 1000 139 139 65 344 47,92 76,56 49,48 173,96
700 700 700 139 139 93 371 47,92 76,56 59,85 184,33
650 650 650 150 150 100 400 49,94 80,00 62,43 192,37
500 700 1000 195 139 65 399 58,08 76,56 49,48 184,12
700 800 650 139 122 100 361 47,92 71,43 62,43 181,78
800 800 1000 122 122 65 309 44,95 71,43 49,48 165,86

Tabela 3: Duração e custo previsto da recria de novilhas holandesas submetidas a diversas taxas de ganho de peso e alimentadas com rações de custo mínimo balanceadas com alimentos apresentados na Tabela2.

Importante observar a tabela 3 e verificar que a estratégia de produção que garantiria o menor custo com alimentação, dentre as simuladas, seria a correspondente a um ganho de peso contínuo de 800 g/dia nas duas primeiras subfases e 1000 g/kg na última subfase, justamente a que apresenta o menor custo para cada uma das subfases. Cabe observar pela Tabela 4 que tal estratégia de condução da recria em confinamento não é a que apresenta os menores custos por kg de ração. Apesar de ganhos de peso diários mais elevados resultarem em custo por kg de ração mais elevados, a redução no tempo necessário para a fêmea atingir o peso ideal à cobrição fica reduzido, o que pode mais que compensar o maior custo por kg da ração, sem considerarmos o efeito da estratégica de ganho sobre o consumo de ração. Ainda, se for considerado o custo de oportunidade do dinheiro no tempo, a situação em que a recria em confinamento é feita mais rapidamente, pode apresentar mais um fator favorável, uma vez que, quanto mais cedo a novilha estiver pronta para a cobrição, mais rápido poderá produzir crias e, dessa feita, iniciar a produção de leite. 

Ganhos de peso nas subfases (g/animal/dia) Custo por kg da ração de custo mínimo a ser formulada em base natural nas subfases em R$
1 2 3 1 2 3
800 800 800 0,055 0,050 0,037
700 700 1000 0,054 0,050 0,037
700 700 700 0,054 0,050 0,037
650 650 650 0,055 0,049 0,037
500 700 1000 0,056 0,050 0,037
700 800 650 0,055 0,050 0,037
800 800 1000 0,055 0,050 0,037

Tabela 4: Custo previsto por kg de ração em base natural para a recria de novilhas holandesas alimentadas com rações à base de silagem de milho, grão de milho e farelo de soja, submetidas a diferentes taxas de ganho de peso.

As informações geradas pelo SAD são disponibilizadas em 9 telas de saída diferentes que apresentam: a composição das rações de custo mínimo em base natural e base seca, além do teor de NDT, Proteína Bruta e consumo de matéria seca previsto, todos para cada subfase t. Existe uma tela de saída específica apresentando o custo com alimentação, necessidade de formulação de ração em kg/dia, e custo total com alimentação, além de um tela que apresenta a duração prevista em dias para cada subfase e a data de início e fim. O SAD já pode ser acrescido dos demais custo envolvidos na recria, tais como custo com mão-de-obra, com a compra ou produção das bezerras, depreciação de equipamentos e benfeitorias, com medicamentos e produtos veterinários, o que permite o cálculo do custo total esperado na produção de um lote de fêmeas de rebanhos leiteiros em confinamento.

 

5. CONCLUSÕES

Verifica-se o caráter multidisciplinar envolvido na modelagem, desenvolvimento e avaliação do SAD, possibilitando ao usuário final do SAD, além da avaliação ex-ante de potenciais estratégias de recria para fêmeas de rebanhos leiteiros, a definição da estratégia que mais se aproxime da minimização dos custos com alimentação das novilhas em recria.

Apesar das limitações com relação ao processo de verificação da validade dos modelos matemáticos, existem fortes evidências da coerência dos resultados.

Vale ressaltar como uma efetiva contribuição do SAD a possibilidade de disponibilizar uma ferramenta que dificilmente estaria acessível ao leigo na formulação e resolução de problemas de programação linear.

Vale mencionar que o SAD está sendo avaliado por especialistas da área de Nutrição de Ruminantes o que tem permitirá, dentro em breve, oferecer aos pecuaristas e extensionistas rurais uma ferramenta de pesquisa operacional amigável e útil em auxiliar a tomada de decisão dos mesmos.

 

6. REFERÊNCIAS

  • Resende Filho, M. de A., Campos, O. F. de, Lizieire, R.S., Pinto, M. de R. (1999) Um modelo para avaliação "ex-ante" da recria de fêmeas leiteiras de rebanhos leiteiros em confinamento, In: Anais do XXXI Simpósio Brasileiro de Pesquisa Operacional, SOBRAPO, Juiz de Fora, MG. (no prelo)
  • Deresz, F. (1992) Alimentação e manejo de novilhas na fase de recria. Informe Agropecuário, Belo Horizonte, v. 16, n. 175, p. 37-40.
  • Yamaguchi, L.C.T., Durães, M.C., Costa, J.L. da, et al.. (1997) Custos de criação de novilhas até o primeiro parto e manutenção de vacas em sistema confinado,