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Sustentabilidade de
Empreendimentos Agroindustriais de Pequeno Porte: uma Aplicação
de Sistemas Dinâmicos
Autores
Wagner Luiz Lourenzani
Email: wagner@alunos.ufv.br
Vínculo: Estudante de Mestrado, Universidade Federal de Vicosa - UFV/MG
Endereço: Rua Jóse Baptista, 359/03, Piedade-SP, Cep.: 18170-000
Telefone: 15 244-2299
Carlos Arthur Barbosa da Silva
Email: carthur@mail.ufv.br
Vínculo: Universidade Federal de Viçosa
Endereço: DTA- UFV, 36571-000, Viçosa, MG
Telefone: 31-899-2292
Resumo
A implantação de empreendimentos agroindustriais de pequeno porte é uma das principais alternativas de política de desenvolvimento rural do país. Alguns programas governamentais (PRONAF-Agroindústria, PROVE, etc.) foram criados para estimular investimentos neste tipo de empreendimento, e assim, criar ocupações no campo, reduzir o fluxo migratório, distribuir melhor a renda e melhorar o bem-estar. Entretanto, os baixos índices de sobrevivência destas empresas tornam importante a consideração de estratégias que promovam sua sustentabilidade. Assim, torna-se necessária a condução de estudos que permitam compreender melhor a estrutura e o comportamento de empresas agroindustriais de pequeno porte no país. Este artigo pretende analisar, por meio da metodologia de Simulação Dinâmica, o comportamento dos fluxos de informação, bens e serviços que dirigem a estrutura destes empreendimentos. Através do processo de mapeamento causal, uma estrutura básica para a simulação dinâmica será construído para que se possa avaliar, compreender e controlar os fatores interdependentes do sistema. A validação e implementação deste protótipo na forma de simuladores ("management flight simulators") contribuirá para a melhoria e elaboração de diretrizes para a sustentabilidade do setor.
Palavras Chaves:
Sustentabilidade, pequeno porte, agroindústria, sistemas dinâmicos
The establishment of small scale agroindustrial enterprises is one of the main alternatives for rural development policies in Brazil. Some programs have been created by the government, in order to stimulate investments in this kind of enterprise. These seek the generation of income and employment in rural areas, the reduction of migratory flows and the improvement of income distribution. Strategies capable to promote the sustainability of these enterprises are very important because of their low rate of survival. Studies are required to increase the understanding about the structure and behavior of small scale agroindustrial enterprises in Brazil. This papers intends to analyze, by using system dynamics, the behavior of information, goods and services flows which control the structure of these enterprises. By using causal mapping, a basic structure for the development of a dynamic simulation model was built. The validation and establishment of the model prototype as "management flight simulators" will contribute to the improvement of knowledge on the factors associated with sustainability and to the formulation of policies and strategies towards this end.
Keywords
Sustainability, Small scale enterprises, agroindustry, system dynamics
1. INTRODUÇÃO
O crescimento da agroindústria tem significativa contribuição no crescimento econômico de um país em desenvolvimento. Geralmente, constitui o principal setor manufatureiro desses países, além de fornecer os principais produtos para exportação (Austin, 1992). Agregando valores aos produtos agropecuários, efeitos multiplicadores são exercidos sobre as oportunidades de emprego e renda, fixando mão-de-obra no campo e incrementando o recolhimento de impostos (Vieira, 1998). No Brasil, o "agribusiness" é o maior negócio da economia. Atualmente representa cerca de 37% do PIB, quase metade dos empregos, 46% do dispêndio dos consumidores, além de representar mais de 60% da balança comercial (Megido, 1998). Mas apesar desta importância, o estudo de questões relativas ao agronegócio é ainda dificultado pela inexistência de um sistema de informações abrangente, principalmente a respeito da agroindústria e sua avaliação no país. Também são poucos os estudos e informações sobre agroindústrias de pequeno e médio porte.
De acordo com dados da Associação Brasileira das Indústrias da Alimentação - ABIA (1991), a agroindústria alimentícia brasileira é composta por um grande conjunto de micro, pequenas e médias plantas industriais que atuam, geralmente em mercados regionais, e um pequeno número de grandes empresas que operam em nível nacional e internacional. Entretanto, existe grande diferença entre o número de estabelecimentos e o valor adicionados por estes. Enquanto 97,2% das agroindústrias de pequeno e médio porte (classificadas por empregarem até 99 empregados) geram 43,9% do valor adicionado, os outros 2,8% (que empregam acima de 100 trabalhadores) são responsáveis por 66,1% do valor adicionado (Silveira, 1997).
As agroindústrias de pequeno porte, como o próprio nome já diz, caracterizam-se por apresentarem uma baixa escala de produção; geralmente, seus produtos são de baixa sofisticação tecnológica e freqüentemente ligados à cultura local. As tecnologias empregadas são as tradicionais ou artesanais, atendendo, em geral, fatias de consumidores de menor poder aquisitivo, em mercados regionais e estima-se que as micro e pequenas agroindústrias são atualmente responsáveis por mais de 70% do emprego no setor agroindustrial (Vieira, 1998). Em geral são importantes empregadores de mão-de-obra não qualificada.
Percebendo a importância do pequeno e médio empreendimento no setor agrícola, o estado tem feito esforços no sentido de criar condições mínimas para que o pequeno agricultor tenha alguma perspectiva de permanência e sustentabilidade na atividade agroindustrial. Algumas experiências em curso no país, como forma de promover a industrialização rural e a verticalização do setor primário, dão uma mostra disso. As mais inovadoras são aquelas em que a criação de pequenas agroindústrias são formadas em rede, utilizando um nível maior de organização dos produtores familiares. São destacados o PRONAF Agroindústria, a nível nacional, e o PROVE, a nível do Distrito Federal.
Apesar das medidas governamentais para elevar o nível de sobrevivência das micro, pequenas e médias empresas, a taxa de mortalidade destas, ainda hoje, é extremamente alta. Vieira (1998), afirma que a taxa de sobrevivência da agroindústria de pequena escala esteja em torno de 4%. Uma pesquisa realizada pelo SEBRAE/MG (1998), sobre a sobrevivência das empresas em geral de pequeno porte em Minas Gerais, estimou que a taxa de mortalidade das empresas que desaparecem (morrem) com até um ano de atividade é de cerca de 36%. Quando se eleva o período de análise para dois anos, a taxa aumenta para 47%. Ou seja, aproximadamente metade das micro e pequenas empresas não sobrevivem ao período de dois anos. Estes altos índices de mortalidade das empresas, logo nos primeiros anos de vida, evidenciam a necessidade não apenas dos tradicionais estudos de viabilidade, mas também de análises que permitam compreender melhor a estrutura e o comportamento do sistema agroindustrial de pequeno e médio porte no país, e assim, considerar estratégias que promovam a sustentabilidade do setor.
O presente trabalho busca, através da metodologia de Sistemas Dinâmicos, contribuir neste sentido. O propósito é gerar conhecimento e compreensão sobre a estrutura e o funcionamento das agroindústrias de pequeno porte no país, para que se possa determinar os pontos de alavancagem e as situações que levam ao sucesso e ao insucesso destes empreendimentos.
2. A METODOLOGIA DE SISTEMAS DINÂMICOS
Sistema é o conjunto de elementos, que coordenados entre si, funcionam como uma estrutura organizada. Entende-se por estrutura, a forma como os elementos se interrelacionam, ou seja, como estes elementos estão conectados uns aos outros. A estrutura não inclui somente aspectos físicos, mas também as políticas que influenciam tanto as atividades individuais como as ligações entre os elementos constituintes. Ou seja, deve-se incluir tanto os aspectos tangíveis quanto os intangíveis (Anderson, 1997). Para os pesquisadores da área de sistemas dinâmicos, a maioria dos problemas com o qual nos deparamos só pode ser entendida e solucionada em sua totalidade, quando examinadas as interações entre suas partes, ou seja, o sistema como um todo (Powersim, 1996a). Para tanto, os analistas e tomadores de decisão desenvolvem modelos mentais. Estes modelos são descrições abstratas do mundo real.
Entretanto, existem sistemas (problemas) complexos que se opõem a soluções intuitivas. Os modelos mentais não conseguem processá-los e interpretá-los com tal grau de variedade e complexidade, ainda mais quando se consideram defasagens de tempo entre causas e efeitos. Geralmente os sistemas não estão em equilíbrio e os seus estados mudam continuamente em função do tempo, apresentando caráter dinâmico. Portanto, modelos conceituais, capazes de representar estes sistemas complexos e dinâmicos devem ser desenvolvidos. E é isso que a metodologia de Sistemas Dinâmicos faz. Sua proposta é servir como ferramenta para a análise de sistemas complexos. O princípio fundamental de sistemas dinâmicos é que todo comportamento dinâmico é consequência da estrutura deste sistema (Powersim, 1996a).
Sistemas Dinâmicos (ou Dinâmica de Sistemas), é o termo aqui usado para denominar a metodologia de "System Dynamics", derivada da Teoria de Controle de Servomecanismos, a qual foi desenvolvida e utilizada para a engenharia militar durante a Segunda Guerra Mundial. (Forrester, 1961). Seu conceito foi originalmente desenvolvido, na década de 50, pelo professor Jay W. Forrester no M.I.T. (Massachusetts Institute of Technology). Embora esta metodologia não seja recente, as aplicações práticas tornaram-se mais comuns a partir da década de 90. Isto ocorreu devido ao avanço da tecnologia de hardware (mais velozes e de baixo custo) e ao surgimento de softwares bastante intuitivos e amigáveis. Estes são programas, que utilizam recursos de simbologia gráfica, facilitando em muito o processo de modelagem e simulação de sistemas.
Conforme explica Cozzarin (1998), um sistema dinâmico é composto por três componentes principais: variáveis de estado, variáveis de controle e loops de realimentação (de feedback). As variáveis de estado são acumuladoras e representam os "estoques" no sistema. As variáveis de controle (de fluxo) modificam os estoques em cada unidade de tempo. Os loops de realimentação podem reforçar a variável que causa mudanças no estoque (loop positivo) ou podem contrabalançá-la (loops negativos, ou de equilíbrio). Segundo Cozzarin (1998), as interações entre os loops negativos e positivos podem ser complexas, por envolverem não linearidades. Assim, os resultados destas interações são também não lineares, o que resulta na complexidade dos sistemas dinâmicos e no caráter imprevisível das mudanças efetuadas nos seus elementos constituintes.
Na área de agronegócios, a simulação dinâmica tem sido usada em estudos de coordenação vertical (Sonka e Cloutier, 1998; Cozzarin, 1998; Wiazowski e Silva, 1999). Risch et alii (1995), utilizaram a metodologia de simulação dinâmica para a análise de estratégias corporativas na indústria de papel e celulose. Davidsen & Asheim, 1993, usaram SD para estudar a indústria de peles de animais na Noruega. Morecroft et alii (1991), modelaram a estratégia de crescimento de uma nova empresa de biotecnologia com o auxílio deste enfoque. Outras aplicações podem ser citadas na área de seguros (Doman et alii, 1995) e indústria de aviação (McCabe, 1998).
3. A APLICAÇÃO DE SISTEMAS DINÂMICOS NO ESTUDO DA SUSTENTABILIDADE AGROINDUSTRIAL
Para que uma empresa tenha sucesso dentro de determinada indústria, além de boa performance em áreas estratégicas, é necessário que esta conduza de forma bastante satisfatória as diversas atividades interdependentes que regem o seu sistema. Esta foi a conclusão obtida por McCabe (1998) que, utilizando estudos de casos e modelos de simulação dinâmica, identificou fatores competitivos, investigou os efeitos de estratégias alternativas, e examinou a eficácia de políticas praticadas por empresas aéreas americanas.
Para o desenvolvimento do esquema lógico e identificação dos fatores relevantes de uma empresa agroindustrial, apoiou-se em um roteiro analítico apresentado por Austin (1992). Com esta ferramenta foi possível detectar questões críticas na análise de projetos agroindustriais e, assim, elaborar diagramas representativos na área de suprimento, processamento e distribuição. Estes três componentes se integram em um sistema completo, mas para melhor compreensão, diagramas de influência são apresentados separadamente.
No segmento de suprimento (Figura 1), tem-se que a produção (oferta) propriamente dita e o fator sazonalidade são os principais controladores da quantidade de matéria-prima disponível para o consumo e, consequentemente, dirigentes do preço da mesma. A seguir, observa-se que com o crescimento no consumo e aumento no preço da matéria-prima, investimentos de médio ou longo prazo em produtividade e qualidade serão promovidos.
Figura 1: Diagrama de influência no segmento de suprimento.
As variáveis apresentadas com um retângulo tracejado, representam os links com os diagramas dos outros segmentos. No de processamento (Figura 2), a quantidade disponível para venda tende a se equilibrar com o estoque da empresa, que por sua vez, se equilibra com o nível de produção. Além disso, a disponibilidade do produto no mercado, a sua qualidade e o custo advindo do seu processamento é que ditam o preço do mesmo. Quanto melhor a capacitação gerencial, mais prudência na escolha da tecnologia e maiores condições de melhorar a qualidade do produto.
Figura 2: Diagrama de influência no segmento de processamento.
Conforme aumenta-se o tamanho da indústria e a sua atuação no mercado (Figura 3), cresce também o número de empresas concorrentes. Isto provoca um acirramento na concorrência do produto, tendendo a barateá-lo. Neste caso, a disputa pelo consumidor se dá pelo menor preço e melhor qualidade.
Figura 3: Diagrama de influência no mercado.
Todos os diagramas anteriores apresentam caráter operacional. Este último diagrama (Figura 4), finaliza o diagrama original, fornecendo características táticas de uma empresa agroindustrial. Os custos operacionais podem ser reduzidos através de um eficaz gerenciamento e de economias de escala. Assim, possibilitam maior lucratividade da empresa, levando à perspectiva de sustentabilidade e crescimento.
Figura 4: Diagrama de influência da empresa.
4. CONCLUSÃO
Estabelecidos os mapas mentais, descritos na seção anterior, os diagramas passarão por um processo de refinamento via discussão com especialistas da área (dirigentes de agroindústrias, bancos de desenvolvimento, agentes de apoio a pequena empresa, etc.). Este processo tem como objetivo a validação do modelo e sua implementação.
Após o modelo ser validado, os sistemas elaborados passam a constituir os chamados "simuladores de vôo gerencial" (management flight simulators), através dos quais diferentes atores do sistema em estudo podem compartilhar suas opiniões a respeito deste problema (modelo mental).
Simulando cenários através do tempo, este modelo poderá orientar, de forma estratégica e dinâmica, a formulação de políticas que promovam a sustentabilidade das agroindústrias de pequeno porte, contribuindo assim, para o sucesso dos programas de verticalização da agricultura familiar.
5. REFERÊNCIAS