AGROSOFT
99 |
PANHA: Sistema Para a
Gerência da Colheita do Café
Autores
José Carlos dos Santos Jesus
Email: jcsjesus@ufla.br
Vínculo: Universidade Federal de Lavras - UFLA
Endereço: Caixa Postal 37, Cep 37200-000, Lavras MG
Telefone: (035) 821-7812, Fax: (035) 829-1442Adriana Madeira Santos Jesus
Email:
Vínculo: Universidade Federal de Lavras - UFLA
Endereço: Caixa Postal 37, Cep 37200-000, Lavras MG
Telefone: (035) 821-7812
André Luiz Zambalde
Email: zambalde@ufla.br.
Vínculo: Universidade Federal de Lavras - UFLA
Endereço: Caixa Postal 37, Cep 37200-000, Lavras MG
Telefone: (035) 829-1123
Resumo
A fase de colheita do café deve merecer especial atenção do produtor, pois, além de representar o resultado obtido após um ano de trabalho, pode influenciar em muito a qualidade final do produto. Nas condições brasileiras é a operação que, isoladamente, mais onera o custo de produção e nos últimos anos tem-se observado uma considerável elevação destes custos, em razão da maior escassez de mão-de-obra e da elevação de seu preço, chegando mesmo a comprometer a atividade. Os cafeicultores que adotam medidas que conduzem à maior eficiência gerencial do processo de colheita conseguem reduzir os seus custos e melhorar a qualidade final do produto, o que significa maiores lucros e a possibilidade de persistir na atividade. Com o objetivo de facilitar o processo de gerência da colheita de café, foi desenvolvido o Software PANHA - Gerência da Colheita de Café. Fruto de um modelo construído através de consultorias realizadas junto a cafeicultores do sul de Minas Gerais, este modelo, desenvolvido em 1995, vem sendo continuamente testado e aperfeiçoado. Entre as transformações provocadas pelo programa nas empresas onde o software foi instalado, destacam-se: 1) a economia de tempo e aumento da produtividade do trabalho do pessoal de escritório; 2) aumento do nível geral de informações sobre o processo da colheita; 3) a implantação de um processo de seleção de "panhadores" visando a eficiência da colheita; 4) determinação de forma precisa do custo da saca de café colhida em cada lavoura. Este artigo analisa os impactos sociais e organizacionais provocados pela implantação deste software no processo de gerência da colheita de café.
Abstract
The phase of coffee harvest must deserve special attention by the grower, because in addition to standing for the result obtained after one years work; it may greatly influence the final quality of the product. Under the Brazilian conditions it is the operation which, singly, burdens the most the production cost and in the last years, a marked rise of these costs has been observed on account of the greater shortage of hand labor and the increase of its price, coming even to jeopardize the business. The coffee grower who adopts measures which lead to greater managerial efficiency of the product succeed to reduce the costs of the harvest and improve the final quality of the product, which means better profits and the possibility of persisting in the business. With a view to making the managerial process of coffee harvest easy, the software PANHA - Management of coffee harvest -was developed. Fruit from a model built through consultories performed with coffee growers in the South of Minas Gerais, this model developed in 1995, has been continuously tested and improved. Among the transformations brought about by the program in the enterprises where the software was established, the following ones are stressed: 1) the economy of time and increase of the work yield of the office staff; 2) increase in the general level of information about the harvest process; 3) the establishment of a selection process of "harvesters" aiming at the efficiency of the harvest. 4) determination in a precise form of the cost of the bag of coffee harvested in each crop . This paper analyses the social and organizational impacts provoked by the establishment of this software in the management process of coffee harvest.
Palavras Chaves
Tecnologia da informação, café, gestão de empresas rurais, colheita de café.
1. INTRODUÇÃO
A fase de colheita do café deve merecer especial atenção do produtor, pois, além de representar o resultado obtido após um ano de trabalho, pode influenciar em muito a qualidade final do produto. Nas condições brasileiras é a operação que, isoladamente, mais onera o custo de produção e nos últimos anos tem-se observado uma considerável elevação destes custos, em razão da maior escassez de mão-de-obra e da elevação de seu preço, chegando mesmo a comprometer a atividade. Os cafeicultores que adotam medidas que conduzem à maior eficiência gerencial do processo de colheita conseguem reduzir os seus custos e melhorar a qualidade final do produto, o que significa maiores lucros e a possibilidade de persistir na atividade.
Segundo Mendes et al. (1995), nos últimos anos a cafeicultura vem passando por grandes mudanças tecnológicas, desde novas alternativas de espaçamentos para o plantio, novas linhagens de cultivares melhoradas até os recentes avanços no controle químico de pragas e doenças de importância econômica. O moderno cafeicultor não pode ficar alheio às novas tecnologias, que proporcionam altas produtividades e um produto de melhor qualidade, a um custo compatível com a atividade.
A colheita é, certamente, a fase mais crítica em todo o processo de produção do café, sendo apontada pelos produtores rurais como um ponto de estrangulamento na exploração da cultura (Silva, 1998). A colheita do café é uma operação complexa com várias etapas e que representa 30% do custo de produção e 40% da mão-de-obra empregada (Neto & Matiello, 1981, citados por Silva, 1998), o que demonstra a elevada importância da boa gerência desta prática para que o agricultor obtenha sucesso em sua atividade.
Este trabalho tem como objetivo descrever questões relativas aos impactos sociais e organizacionais provocados pela implantação deste software no processo de gerência da colheita de café. Trata-se de uma discussão sobre o uso de novas tecnologias de informática no setor agropecuário e, em especial, no setor cafeeiro.
2. METODOLOGIA
A abordagem metodológica empregada neste trabalho é a abordagem qualitativa baseada num estudo de multicasos. Trata-se de um estudo exploratório. Segundo Selltiz et al. (1967), as pesquisas exploratórias têm como objetivo principal proporcionar uma maior familiaridade com o problema, com vistas a torná-lo mais explícito, sendo que, na maioria das vezes, estas pesquisas assumem a forma de pesquisa bibliográfica ou Estudo de Caso. Em se tratando do setor rural esta abordagem é ainda mais adequada por permitir levantar aspectos vagos e não muito bem definidos.
A pesquisa foi realizada junto a seis cafeicultores da região de Santo Antônio do Amparo, cidade do sul de Minas Gerais. A amostra foi composta de pequenos, médios e grandes produtores, sendo que o volume de café colhido variou de 300 a 12.000 sacas/safra.
O acompanhamento desses cafeicultores vem sendo realizado de forma sistemática durante as safras, de 1996 a 1999. Neste período foram mantidos contatos pessoais e coletadas as observações e opiniões dos usuários do sistema, além do acesso às suas informações registradas pelo software.
3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
O software foi desenvolvido através de consultoria para um grupo empresarial situado na região de Santo Antônio do Amparo, sul de Minas Gerais, o qual tem na cafeicultura a sua principal atividade. O grupo empresarial possuía um total de seis fazendas em 1996, com uma média de produção em torno de 11.500 sacas beneficiadas de café de excelente qualidade, destacando-se os cafés especiais, café despolpado tipo exportação e o café orgânico, exportados diretamente para os Estados Unidos e Japão.
Nas empresas onde o sistema foi implementado, apesar de algumas possuírem uma estrutura administrativa relativamente bem preparada, as informações necessárias para o adequado gerenciamento da colheita de café não eram acessíveis. Os funcionários ocupavam grande parte do seu tempo durante a colheita realizando os controles necessários para o pagamento dos safristas, contudo, não conseguiam-se montar relatórios técnicos a tempo de permitir a tomada de decisões para a redução dos custos da colheita.
Destacavam-se como principais dificuldades ou problemas:
- o elevado número de dados a serem processados devido ao contigente de mão-de-obra volante empregado na colheita. Os grandes cafeicultores participantes desta pesquisa empregam entre 400 a 1000 pessoas no pico da colheita de café; os médios de 100 a 400 pessoas e os pequenos produtores até 100 pessoas. Estes números, no entanto, são relativos, em função do período de colheita e são baseados apenas para colheita manual do café. Neste contexto, o pagamento semanal ou quinzenal ocupa grande parte do tempo do pessoal de escritório para o controle e pagamento desta mão-de-obra;
- a incapacidade de obter informações precisas sobre o andamento da colheita em cada lavoura;
- a falta de coeficientes técnicos que servissem como referência para o acompanhamento do processo de colheita de café, permitindo corrigir erros de desempenho das turmas ou identificar os fatores que estariam prejudicando a eficiência das turmas;
- as análises sobre a colheita, com o gerenciamento manual dos dados, ocorriam somente de 30 a 60 dias após o término da colheita.
Estas dificuldades foram os elementos motivadores do desenvolvimento do Sistema de Gerência da Colheita de Café. A metodologia empregada no desenvolvimento do software baseou-se nos princípios e paradigmas da Engenharia de Software (ES) e no ciclo de vida denominado de prototipação, com característica cooperativa (Bodker et al., 1991). Utilizaram-se procedimentos metodológicos propostos por Greenbaum e Kyng (1991) para a elaboração de projetos participativos.
Com o sistema depurado e em "uso", procurou-se identificar os efeitos impactos que o software produziu nas empresas. Nas observações efetuadas, destacou-se principalmente o efeito de redução dos custos de colheita. Esta redução se manifestou em função dos seguintes aspectos: a) redução do número de funcionários de escritório dedicados ao gerenciamento da colheita; b) seleção dos "panhadores" através de análises de desempenho; c) negociação do preço do café colhido pelos "colhedores de café".
Com relação a estes aspectos cabe destacar que em apenas dois casos foi observado o uso adequado do relatório para a negociação do preço pago aos "colhedores de café" por balaio de café. Trata-se de um recurso do sistema desenvolvido para a redução do custo da colheita de café. Este relatório foi incorporado ao sistema na safra 97/98 a pedido do gerente geral de uma das grandes empresas de café estudadas: "Eu quero que o programa diga o quanto eu devo pagar por litro de café colhido. Tem jeito ?" A implementação desta rotina resultou numa redução de 9% no custo médio do balaio de 60 litros, em relação à safra anterior. Na opinião do gerente, este era o seu maior problema e erros na determinação do valor a ser pago por litro causavam grandes prejuízos à empresa. Cabe destacar que este tipo de utilização não havia sido definido a princípio para o sistema. Antes do processo de informatização, esta média não era obtida em tempo hábil.
O uso de relatórios de desempenho dos colhedores de café que, no caso de algumas turmas, partiriam de 5000 lançamentos de colheita para serem gerados, permitiu que fossem adotadas medidas corretivas sobre o desempenho de cada colhedor de café ou mesmo sobre a turma no geral: "Eu, antes, não tinha uma noção clara do que estava acontecendo. Eu mandava embora ou tomava decisões para os casos mais graves como brigas, ou indivíduos muito faltosos, mas muito mesmo" (declaração do gerente geral de uma das grandes empresas de café estudadas). Estes relatórios provocaram o processo de seleção dos "colhedores" visando a redução dos custos de colheita. Para a empresas de menor porte, o processo de seleção dos "colhedores" não foi implementado com tanta intensidade quanto nas grandes empresas devido a sua limitada capacidade financeira e de produção.
A estrutura administrativa das empresas estudadas e a qualificação gerencial dos funcionários representam os fatores decisivos para o aproveitamento integral do potencial do sistema. Empresas com deficiências administrativas utilizam o sistema apenas como um instrumento para acelerar a manipulação do grande volume de dados e para reduzir o tempo gasto por funcionários de escritório nas tarefas de pagamento dos "colhedores de café" , tais como, a emissão de recibos, de lista de pagamento, etc. Nestas empresas, os aspectos gerenciais que permitiriam a redução dos custos de colheita foram ignorados, tanto pelo empresário rural quanto pelos funcionários que trabalhavam na administração,.o que equivale a dizer que o software não representa "a salvação da lavoura", a não ser que as pessoas que o utilizam estejam devidamente preparadas e estimuladas a fazer dele um instrumento para a eficiência do processo de colheita do café. Observou-se, em um dos casos estudados, uma redução de 75% do pessoal de escritório envolvido com o processo de gerenciamento da colheita de café. O sistema provocou a valorização do funcionário de escritório que possui conhecimentos de informática, diferenciando-o dos demais, contudo, sem afetar o seu nível de remuneração.
O Sistema de Gerência da Colheita de Café, segundo os usuários, promoveu uma série de impactos econômicos e sociais na medida que em que permitiu:
- atender às necessidades de controles para o gerenciamento da colheita de café, conferindo rapidez e eficiência;
- obter economia de tempo, aumentando a produtividade do trabalho;
- obter a todo momento informações sobre a quantidade de café colhido, fazer previsões sobre a quantidade a colher e o tempo demandado, isto é, conhecer de forma precisa e rápida, o andamento da colheita do café;
- o aumento da riqueza de informações em geral;
- determinar o rendimento de "turmas" e de trabalhadores dentro de "turmas", com vistas, inclusive, à seleção dos melhores indivíduos;
- melhorar os processos de avaliação da colheita, criando novos padrões de análise de desempenho;
- através das informações fornecidas, corrigir erros durante o período de colheita, reduzindo sensivelmente os seus custos;
- determinar o custo da saca de café colhida em cada lavoura;
- reduzir drasticamente a necessidade de pessoal de escritório para o controle da colheita de café;
- reduzir o número de "colhedores" necessários, através da seleção dos melhores;
- aumentar o nível de remuneração recebido pelos "colhedores" selecionados.
4. CONCLUSÕES
Este trabalho procurou descrever os impactos sociais e organizacionais provocados pela implantação deste software no processo de gerência da colheita de café. Considerando que no setor rural, em especial no setor cafeeiro, existe uma carência de tecnologias de informação apropriadas às suas características peculiares, este trabalho vem oferecer sua contribuição para amenizar esta realidade.
Os resultados apresentados por este trabalho enfatizam a importância de estudos que avaliem os impactos do uso destas novas tecnologias: "Os impactos potencialmente inseridos na adoção de novas tecnologias são tão significativos que é essencial a realização de estudos apurados das diversas alternativas e respectivas conseqüências para orientar a sociedade sobre a melhor forma de adoção" (Segre e Xexeo,1994).
5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
6. BIOGRAFIAS
José Carlos dos Santos Jesus - Engenheiro Agrônomo (ESAL, 1987), Mestre em Administração Rural (UFLA, 1993), Doutorando em Administração da Produção pela COPPE/ITOI-UFRJ. Professor da Universidade Federal de Lavras/MG. Consultor em informática rural e desenvolvedor de softwares agropecuários. Áreas de interesse: sistemas de informação e tomada de decisão, Informática Aplicada à Agropecuária, pesquisa operacional e administração da produção.
Adriana Madeira Santos Jesus - Engenheiro Agrônomo (ESAL, 1988), Mestre em Fitotecnia (UFLA, 1994) e Doutoranda em Fitotecnia com especialização em café pela UFLA.
André Luiz Zambalde - Doutorando em Engenharia de Sistemas e Computação na COPPE/UFRJ. Professor da Universidade Federal de Lavras/MG UFLA, pesquisador em Informática Aplicada à Agropecuária e Conselheiro da SBI-AGRO.