AGROSOFT
95 Feira e Congresso de Informática Aplicada à Agropecuária e Agroindústria |
A Oferta de Software Agropecuário no Estado de São PauloContato
Nilson Antonio M. Arraes
FEAGRI - UNICAMP
Barão Geraldo
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13.083-970 - Campinas - SP
e-mail:nilson@agr.unicamp.br
Autoria
Nilson Antonio M. Arraes - UNICAMP
Christiano Lyra Filho - UNICAMP
RESUMO
Este trabalho tem como objetivo fornecer elementos para se conhecer como tem se dado o processo de difusão das tecnologias da informação na agricultura brasileira através da análise da oferta de programas computacionais comerciais para aplicações em atividades rurais, desenvolvidos pelo setor privado do Estado de São Paulo. De dezembro de 1992 a fevereiro de 1993 foi conduzido um levantamento de dados sobre 14 empresas, totalizando 38 programas. Estes programas foram analisados em relação a área de aplicação, técnica utilizada, integração entre programas e/ou sistemas automatizados, hardware requerido e preço. Percebe-se que somente os setores da agricultura capitalizados e tecnificados tem tido acesso a estas tecnologias.ABSTRACT
The main purpose of this work was to obtain the necessary information to evaluate the process of information technology diffusion in the Brazilian agricultural area. The commercial software for rural activities developed in the State of São Paulo were analysed. From December 92 to February 93 fourteen software house were investigated and thirty eight different software obtained. Those software were analysed in relation to application, technical level, integration with other software and/or automation systems, necessary hardware and price. The results shoed that only the capitalised and technical sectors of the agrosystems have access to this technology.
1. Introdução
Uma das características marcantes da tecnologia da informação é sua abrangência. Suas aplicações cobrem todos os setores da economia mesmo que de forma e intensidade diferenciadas em cada setor, ou até entre atividades dentro de um mesmo setor. Se suas aplicações apareceram inicialmente e de maneira mais rápida e generalizada nos setores terciários e secundários, não tardaram a se expandir para o setor primário. Na agricultura, a tecnologia da informação podem ser compreendidas como mais uma etapa no processo de modernização.
Iniciado, no Brasil, na década de 60, a modernização da agricultura foi marcada pela intensiva adoção de insumos mecânicos, químicos e biológicos, estimulado por incentivos governamentais e internacionais. Justificado por contribuir no incremento da produtividade e da produção agrícola, a adoção deste pacote tecnológico provocou graves conseqüências.
A tecnologia mecânica, sendo fortemente poupadora de mão-de-obra, liberaram uma enormidade de trabalhadores rurais que, diante de uma industrialização modesta, não conseguiam ser absorvidos, criando os cinturões de miséria nas grandes cidades e rebaixando os salários dos que permaneciam no campo. A forma com que foi conduzida a difusão desta tecnologia, onde os grandes proprietários de terra e os produtores de culturas de exportação foram os maiores beneficiários dos subsídios para sua adoção, conduziram à concentração de renda e terra devido a perda de competitividade dos produtores excluídos deste processo. As práticas culturais baseadas no manejo intensivo do solo e no uso de defensivos e fertilizantes químicos têm sido danosas ao meio ambiente, aumentando a erosão e contaminando a terra, o ar e a água.
Estes exemplos demonstram que uma opção tecnológica não deve ser, exclusivamente, avaliada pelos seus benefícios econômicos, no caso, refletidos no aumento da produtividade e da produção. Os aspectos ambientais e sociais e, a forma de difusão devem ser analisados conjuntamente, caso pretenda-se conduzir a uma sociedade equitativa e sustentável. Neste contexto, o processo de informatização assume um papel muito importante pois, devido à heterogeneidade estrutural da agricultura nacional, as formas de condução deste processo podem reduzir ou ampliar ainda mais as diferenças sociais existentes.
Embora a tecnologia da informação englobem diversas formas de aplicação, a tecnologia de gerenciamento de informações através de computadores e aplicativos específicos são as que, aparentemente, têm sido mais adotadas. Até porque, sua oferta foi, por alguns anos, quase que exclusiva em relação aos outros tipos de aplicação (automação, telemática, robótica).
Este trabalho tem como objetivo fornecer elementos para se conhecer como tem se dado o processo de difusão da tecnologia da informação na agricultura brasileira através da análise da oferta de programas computacionais comerciais para aplicações em atividades rurais, desenvolvidos pelo setor privado do Estado de São Paulo.
2. Levantamento de Dados
O levantamento das empresas que desenvolvem/comercializam programas para o setor agropecuário foi realizado através dos dados cadastrais de levantamentos anteriormente realizados4 e através de artigos publicados em revistas e jornais de informática e agropecuária.
Constatou-se que, das 38 empresas do Estado de São Paulo citadas nos levantamentos anteriores, 12 continuavam abertas e atuando na área (desenvolvimento/comercialização de programa computacional agrícola), 8 continuavam abertas mas deixaram de atuar na área, 4 fecharam e 14 não se conseguiu contatar com os dados existentes. Das 19 empresas obtidas através das publicações em jornais e revistas, 14 continuavam abertas e atuando na área e 5 não se conseguiu contatar. Logo, resultaram 26 empresas sendo que todas manifestaram interesse em participar do levantamento.
As informações foram solicitadas através de questionário (via correio) com perguntas abertas. Para orientar seu preenchimento acompanharam questionários já preenchidos para serem utilizados como modelo. O levantamento dos dados foi feito entre dezembro/1992 e fevereiro/1993.
3. Resultados Obtidos
Das 26 empresas interessadas em participar do levantamento, 14 responderam aos questionários fornecendo informações sobre um total de 38 programas.
3.1 Empresas
(i) atuam na área de consultoria em informática de modo geral e planejamento da produção ou de consultoria agropecuária e agro-industrial, e foram criadas nos anos 80.
(ii) em 70% dos casos são empresas com menos de 10 funcionários. A área de informática agrícola, em média, tem ocupado 85% dos funcionários e tem sido responsável por 70% do faturamento bruto total.
(iii) metade delas tem procurado formas de cooperação para o desenvolvimento de programas, principalmente, através de universidades.
3.2 Programas
3.2.1 Áreas de Aplicação
A oferta distribui-se em 26%, 47%, 8% e 18% para as atividades administrativas, de produção animal, de produção vegetal e de produção agro-industrial/insumos, respectivamente. Não foram encontrados programas para as atividades de suporte.
Os programas administrativos podem atuar desde uma atividade específica de um determinado setor (por exemplo, controle de estoques, no setor de compras e folha de pagamento, no setor de pessoal) até a integração de várias atividades de diversos setores. Os programas que integram vários setores, normalmente, são comercializados em módulos e oferecem índices técnico-econômicos para auxiliar a tomada de decisões. Dos 10 programas administrativos, 4 são pacotes integrados e 6 são programas para atividades específicas (2 econômicos, 2 financeiros, 1 administração de pessoal e 1 controle de máquinas).
Entre os programas de produção animal destacam-se aqueles dirigidos à pecuária de leite e de carne. A quase totalidade dos programas para controle de criações incluem módulos para controle produtivo, reprodutivo, sanitário, genealógico e de crescimento/localização.
Entre os programas para produção vegetal, verifica-se que todos são dirigidos às culturas integradas a agro-indústria - cana-de-açúcar (usinas e destilarias), citricultura (indústria de sucos) e silvicultura (indústria de papel e celulose). De modo geral, a atividade de produção vegetal apresenta-se pouco explorada inexistindo programas dirigidos a culturas temporárias ou aplicados ao planejamento da irrigação, controle de pragas e doenças, controle da adubação, efeito de condições climáticas sobre a produtividade das culturas.
Os programas para produção agro-industrial/insumos realizam, principalmente, o planejamento do processo de produção através de técnicas de otimização. Eles são dirigidos às usinas/destilarias, fábricas de ração, fábricas de fertilizantes e sistemas integrados de produção avícola. Esta atividade também apresenta-se pouco explorada, inexistindo programas para controle de fornecimento, amostragem e análise de matéria prima e, controle de armazenamento e comercialização.
3.2.2 Outras informações
(i) em relação à técnica utilizada, distribuem-se em 74% realizando cálculos matemáticos e estatísticos simples, 24% utilizando técnicas de pesquisa operacional e 2% são sistemas especialistas.
(ii) a integração entre programas tem ocorrido em menos de 30% dos programas e a integração com sistemas automatizados e quase inexistente.
(iii) em 84% dos programas, um microcomputador PC/XT com 640 Kb de RAM e 20 Mb de disco rígido atende a necessidades de hardware. O sistema operacional padrão tem sido o DOS.
(iv) 55% dos programas custam menos de US$ 1.000 e concentram as aplicações para as empresas agropecuárias. Normalmente incluem instalação e manual.
4. Considerações Finais
Embora não se possa garantir a representatividade da amostra de programas em relação à oferta total, este levantamento vem corroborar a observação feita por BORNESTEIN & VILLELA (1991) de que o uso da informática tem ficado restrito a grandes complexos agro-industriais, empresas agropecuárias e grandes produtores rurais dedicados a cultivos nobres, agricultura de exportação ou pecuária de alta produtividade.
A aplicação da tecnologia da informação têm sido desenvolvidas a partir de um sistema de produção baseado nos insumos modernos. Exercendo maior controle sobre os processos de produção , potencializa-se a redução do uso de insumos e o aumento da produtividade/produção. O maior controle sobre os processos de gestão possibilitam maior rapidez e precisão de informações. A incorporação de "conhecimento" aos dispositivos e equipamentos ampliam sua participação na produção (robótica) e na gestão (sistemas de apoio à decisão).
Verifica-se, deste modo, que a aplicação da tecnologia da informação podem contribuir positivamente nos aspectos econômicos e ambientais. Entretanto, estas aplicações sendo desenvolvidas sobre o sistema moderno de produção trazem consigo as características desse, ou seja, são intensivas em capital e na tecnologia mecânica (ampliadas com a robótica) são poupadoras de mão de obra.
Devido às disparidades da agricultura brasileira, percebe-se que, à medida que se comprovem os benefícios econômicos desta tecnologia, somente os setores da agricultura capitalizados e tecnificados terão acesso a estes benefícios. Consequentemente, se acrescenta mais um fator de intensificação do processo de concentração de renda e terra, agravando ainda mais as diferenças sociais.
Naturalmente não se trata de uma apologia contra o uso da informática, até porque o processo de globalização tem cada vez mais internacionalizado os padrões tecnológicos, mas de, novamente, chamar a atenção para um amplo setor da agricultura que tem estado à margem das políticas públicas e dos frutos do progresso. Estudos realizados pela FAO e INCRA (1994) no Brasil dividem o mundo agrícola em dois grandes grupos - patronal e familiar - sendo que, aproximadamente, 5 milhões dentre os 7 milhões de estabelecimentos rurais brasileiros enquadram-se no segundo grupo e caracterizam-se pelo acesso, quando muito, parcial às inovações tecnológicas e aos mercados nacionais e internacionais e não tem acesso à maioria das políticas e programas governamentais. Contudo, além de responderem por grande parte da ocupação da mão-de-obra rural, são responsáveis por uma parcela altamente significativa da produção agropecuária.
5. Bibliografia
BORNSTEIN, C.T. e VILLELA, P.R.C. (1991). O uso da informática em cooperativas de laticínio: algumas reflexões sobre a modernização na agricultura. Reforma Agrária, set/dez, pag. 53-73.
FAO/INCRA (1994). Diretrizes de Política Agrária e Desenvolvimento Sustentável para a Pequena Produção Familiar. Projeto UTF/BRA/036/BRA. Versão preliminar. Brasilia
4INFO - Revista Brasileira de Informática, ano VI, n(62, mar/88.INFO - Revista Brasileira de Informática, ano VII, n(74, mar/89.GUIA DE SOFTWARE CWB (1988), Edição especial, Computerworld do Brasil Serviços e Publicações LTDA.
Catálogo de Software Rural EMBRAPA/CNPGL - UFJF (1990).
1 - Este trabalho foi extraído da dissertação de mestrado "Levantamento das aplicações das tecnologias da informação no meio rural com estudo de caso sobre a oferta de software agrícola no Estado de São Paulo", apresentada à Faculdade de Engenharia Elétrica da Universidade Estadual de Campinas em dezembro de 1993.
2 - Prof. Colaborador do Departamento de Planejamento e Produção Agropecuária da Faculdade de Engenharia Agrícola/UNICAMP [tel: (0192) 39.7051, fax: (0192) 39.4717, e-mail:
nilson@agr.unicamp.br ].3 Prof. Adjunto do Departamento de Engenharia de Sistemas da Faculdade de Engenharia Elétrica/UNICAMP.